“O povo não deve temer o seu governo, o governo deve
temer o seu povo.”
Este texto pode conter clichês e frases feitas, começando
pela citação acima e o titulo deste artigo.
Em 29 anos acho que, a única manifestação que vi e lembro
muito pouco foi a da era Collor, no mais pra mim no Brasil isso não era uma
pratica, sequer uma possibilidade, e eu realmente não me importava com isso até
estar na faculdade.
Resolvi ser jornalista, pela paixão por escrever
unicamente. Primeiros dias de aula, eu com 17 anos, recém-chegada do ensino
médio, levei um choque com as disciplinas de sociologia e filosofia. Não que eu
fosse algum tipo de alienada, até quis seguir a carreira e Filósofa e lia
coisas básicas sobre o assunto, mas a universidade realmente mexe com as nossas
cabeças.
São inúmeros autores, correntes, pensamentos e você
inebriado quer sair com a camiseta do Che Guevara gritando “viva la revolucion!”, acha que a anarquia seria a melhor maneira
de viver uma sociedade melhor e nada disso pra você é utópico.
Como futura jornalista, acompanhava diariamente os
noticiários e sempre via manifestações e protestos pelo mundo, mas sinceramente
nunca me perguntei nessa época o porquê do Brasil não ter esse tipo de coisa.
O tempo passou, eu já não queria mais ser anarquista nem
sair militando por ai, achei que por meio dos meus textos, publicados em
jornais eu conseguiria atingir o objetivo de fazer as pessoas refletirem mais.
Mal sabia eu onde estava entrando. Meu primeiro artigo sobre politica foi
“gentilmente” censurado pelo dono do jornal da minha cidade (gentilmente,
porque cidade pequena todo mundo é amigo do seu pai, mãe, tio e papagaio, então
dizem essas coisas como se fossem seus camaradas), dizendo que era muito forte
e que eu deveria tomar mais cuidado com o que escrevesse.
Bom, o tempo passou, eu já não acreditava em quase mais
nada e tomei a velha máxima do “tudo no Brasil acaba em pizza mesmo”, como
verdade.
Passados alguns anos, desempregada e querendo conhecer
coisas novas fui parar na capital Argentina, Buenos Aires.
E você me pergunta: “porque raios você esta falando tudo
isso?”, e te digo: porque foi lá, num país com uma economia mais fraca e tão
pequeno perto do Brasil que eu comecei a ver o quanto o brasileiro era alienado
(ou comodista.)
Chegando lá, comecei a perceber que todo dia havia algum
tipo de protesto. Ruas fechadas, transporte publico parado, greves, cartazes
por todos os lados, e me incomodei um pouco no começo, eu pensava: “poxa, esse
povo não tem mais o que fazer não?”.
Com o tempo fui conhecendo as pessoas de lá, desde jovens
até pessoas bem mais velhas, e não é brincadeira, todos entendiam e discutiam
política quase o tempo todo. Eles sabiam exatamente o porquê de seus protestos
e as conversas eram deliciosamente interessantes.
Depois de passar cerca de dois anos lá, aprendi muito
sobre cidadania e sobre lutar pelo que se quer não só escrevendo, mas indo pra
rua, mostrando a cara. Vi que o Brasil ainda tem muito que aprender em relação
ao conhecimento de sua história política, e não fingir sofrer de amnésia.
Hoje o mundo sabe que o brasileiro não se importa somente
com futebol e carnaval, vivemos e vimos nestes últimos dias a maravilhosa e
real festa da democracia, jovens nas ruas, isso realmente me fez acreditar que
aqui ainda tem gente que quer um país melhor.
Os famigerados 0,20 centavos foram o estopim, agora não
podemos fugir a luta, existem muitas coisas a serem reparadas, as PEC’s 37 e 33
a serem votadas que devem urgentemente ser vetadas. A “cura gay” que ocorreu à
surdina por uma pessoa sem escrúpulo algum e que é presidente de uma comissão
que visa proteger os direitos humanos, por trás disso não é só protestar contra
essa “cura”, mas perguntar por que esse cara está lá. Sem falar na lei do
nascituro, algo que deve ser realmente refletido e questionado.
Do “vamos pra rua”
ao “continuemos lá” é que devemos chegar.
Maria Clara Carrilho, jornalista.